A Árvore

 
“A   Á R V O R E” - de Carlos Leite Ribeiro

Eu sou uma árvore, e já há muito tempo.
Embora já não seja nova nem a mesma de alguns anos atrás, sou feliz. Até muito mais feliz que então!
Todos os dias vivo um dia diferente. À minha frente nunca passam duas pessoas completamente iguais.
As pessoas são como nós, todas diferentes umas das outras. Vejo todos os dias caras diferentes, de pessoas novas, menos jovens e velhas - e sou feliz!
E, para quem diz " Quem vê caras não vê corações", o mundo para elas encontra-se metido entre quatro paredes, pois não podem ver outros olhos com toda a sua profundidade, e então, necessariamente, não podem ver nenhum coração...
Há pedaços de mim que se multiplicam, mas eu não crescerei muito mais.
O meu mundo e o meu espaço será sempre este para sempre.
Por vezes alguém passa por mim e risca-me ou tira um pedaço de casca...
Noutro dia, um louco qualquer, pensou fazer no meu local um rito satânico, e com uma foice tentou cortar-me. Para me defender, despeguei um ramo meu, pesado que caiu em cima desse louco que logo desapareceu com sua foice.
À... Também noutro dia, um par de namorados gravou na minha casca um par de coraçõezinhos, atravessados por uma flecha (a flecha do Cúpido...).
Achei tanta graça que até tive vontade de os chamar e de lhes desejar muitas felicidades e um brilhante futuro.
Mas, também já têm feito chichi contra mim e até outras coisas. São presentes que eu dispenso muito bem!
Posso não ter estômago, intestinos, pernas, braços ou cara, mas tenho coração, que é só meu!
Podem rirem-se, por ser uma árvore com coração, mas é real...
Vou contar-vos um grande segredo: todas as noites, quando a Lua aparece e faz estremecer os corações mais frígidos e que envolve com o seu luar os corações mais apaixonados pelos cantos mais escuros, eu arranjo-me, componho muito bem os meus ramos e, vou ter com o meu namorado...
chiuuu, porque isto é segredo!
E lá ficamos os dois muito; entrelaçados um no outro, trocando olhares, carícias e carinhos, alimentando um amor que eu considero platónico.
Depois, volto para o meu lugar, fecho as pálpebras, mesmo sem ter olhos para fechar.
E faço hóóó-hóóó...
Carlos Leite Ribeiro - Marinha Grande - Portugal